É verdade que algumas vezes nos irritamos com
aquele que vem nos bater à porta de casa, nas horas mais inconvenientes, a nos
pedir coisas. Acontece de nos incomodarmos com alguém que nos aborda na
rua, a pedir um trocado, algo para comer, umas moedas. Às vezes, somos
intolerantes com aquele que insiste em solicitar algo no sinaleiro, na calçada,
cruzando nosso caminho nos momentos de maior pressa.
É comum julgarmos aquele que pede, o que estende
a mão aguardando moedas, o que faz da esmola a fonte de sobrevivência. Fazemos
análises rápidas, usamos de conclusões que se tornam chavões, e rotulamos essas
criaturas. Poucas vezes reflectimos sobre o que teria levado essa ou
aquela pessoa a essa situação de mendicidade.
Não encontramos tempo para outras análises e
possibilidades para avaliar melhor a situação. Raramente nos colocamos em
seu lugar, num exercício de empatia e compreensão.
Alguns ali estão porque se deixaram levar no
roldão dos vícios, perdendo família, emprego, relações sociais. Outros
viram o desemprego desestruturar sua vida, jogando-os à margem da sociedade,
sem recursos para manter-se e manter aos seus. Outros trazem histórias de
vida difíceis, de famílias complexas, sem terem tido acesso aos bancos escolares,
impedindo que muitas oportunidades lhes surgissem no caminho.
Enfim, eles estão ali, vivenciando suas dores.
De um modo geral, pensamos que aquele que quer,
que tem força de vontade, que se esforça, consegue superar toda e qualquer
adversidade. Sim, pode ser verdade. Mas, nem sempre. É verdade para
aqueles com resistência emocional, com estrutura intelectual, com um
carácter mais forjado e sólido. Contudo, são muitos os frágeis, que
sucumbem às próprias agruras, sem forças para se erguerem. Já pensamos, em
algum momento, se nós seríamos fortes, bravos, corajosos, se revezes
semelhantes nos alcançassem?
Se tivéssemos nascido num lar desestruturado, se
tivéssemos nos deparado com a fome, a miséria, se não tivéssemos nenhuma
referência positiva, conseguiríamos tudo superar?
Talvez se, em nossas reflexões, andarmos por essa
via, ela nos ajude a termos um pouco de empatia. E, assim procedendo,
colocando-nos no lugar desses que mendigam, possamos substituir, por um momento
que seja, nosso julgamento apressado por um pouco de compaixão. Seria tão
salutar se pudéssemos oferecer, a esses que passam por tantas dificuldades, um
olhar de compaixão.
Com certeza lhes faria bem que os olhássemos no
fundo dos olhos, como irmãos, que verdadeiramente são. Um sorriso, um
olhar de compreensão, um aceno ou um cumprimento, podem mudar o seu dia.
Façamos esse exercício.
Esvaziemos um tanto nossos corações dos frios
julgamentos que coleccionamos, para nos propormos a uma outra análise. Poderemos
fazer isso um dia, outro dia, ao menos para uma pessoa. Será o início de um bom
exercício, que poderá se desenvolver, em nossa intimidade, na sequência das
semanas.
E, com certeza, fará muito bem a quem perdeu sua
auto-estima, há muito tempo, ser olhado como um ser humano, alguém credor de um
cumprimento, de um aceno, um sorriso.
Pensemos nisso.
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